Introdução
Criar um ambiente de aprendizagem
motivador é, simultaneamente, um dos maiores problemas e um dos maiores
desafios que se apresentam aos professores de hoje. Quando há 17 anos atrás o
Livro Verde para a Sociedade da Informação em Portugal (1997), fazia referência
para a implementação de uma escola informada e informatizada para o século XXI,
ao referir que a escola tinha de passar a ser encarada como um lugar de
aprendizagem ao invés de ser um espaço onde o professor se limita a transmitir
o saber ao aluno, estávamos longe de pensar que a mudança seria tão difícil de
acontecer.
Sabemos que a sociedade contemporânea
se encontra num processo de rápidas mudanças, onde as Tecnologias de Informação
e Comunicação (TIC) assumem um relevo cada vez maior, geram múltiplas potencialidades,
criam novos cenários e promovem ambientes extremamente ricos e promotores de
uma multiplicidade de experiências pedagógicas impulsionando as pessoas a
conviverem com a ideia de que a aprendizagem é um processo que se desenvolve ao
longo de toda a vida, como nos menciona Coutinho (2009). A integração e
desenvolvimento das TIC na educação, afigura-se como condição fundamental para
enfrentar os problemas colocados pela sociedade do conhecimento.
Uma das grandes contribuições das TIC é
dar a oportunidade para as crianças experimentarem a excitação de se empenharem
em perseguir os conhecimentos que realmente desejam obter. Segundo Papert
(1997), é importante para as crianças o desenvolvimento das capacidades de
observação, de reflexão e de coordenação psicomotora. A introdução de recursos multimédia,
adaptados e adequados aos contextos da aprendizagem, servirá, certamente, como
instrumento quase insuperável na dinâmica de sala de aula, catapultando os
alunos para um estado de predisposição para a aprendizagem.
Contextualização
Entre as atividades desenvolvidas pela
escola, a leitura é a mais fundamental na vida de um aluno (Freire, 1993). Se
ler é, segundo Foucambert (1997), um processo de descobertas, atividade de
assimilação de conhecimento, interiorização e reflexão, então torna-se
necessária a motivação da escola para com seus alunos. Porém, verificamos que a
leitura é vista pelos alunos como uma atividade aborrecida e monótona. Na
maioria das aulas de Português as atividades de leitura realizada são sucedidas
de interpretação de textos, compostas de perguntas óbvias, tirando o sentido da
leitura o qual é substituído por uma obrigação desinteressante que é o
questionário e, principalmente, a forma como este é apresentado (Freire, 1993;
Foucambert, 1997). Devido à falta de incentivo, criatividade, liberdade de
interpretação, a leitura é apresentada aos alunos de uma forma que os leva a
considerá-la como algo desnecessário e aborrecido.
Desde que foram implementadas as Provas
de Aferição no 4.º ano do 1.º CEB, denominadas desde 2013 de Provas Finais de
Ciclo, o relatório anual de análise dos resultados nacionais divulgados pelo
GAVE (2010; 2011; 2012; 2013) evidencia que os alunos do 4.º ano do 1.º CEB
manifestam um fraco desempenho ao nível da leitura, nomeadamente nos aspetos
relacionado com a identificação de uma informação explícita no texto, integrada
na apresentação de uma personagem; dedução de sentimentos de uma personagem a
partir de uma expressão em contexto frásico; identificação do referente textual
de um pronome; relacionamento da informação extraída de um texto com elementos
de sentido equivalente; comprovação de uma ideia com elementos textuais;
seleção de informação num texto; conclusão do sentido de uma expressão em
contexto frásico; seleção da informação num texto; reconstituição de uma
sequência textual; identificação de informação explícita no texto – sensação
vivida por uma personagem; e perceção do sentido implícito num texto.
Perante toda a problemática que envolve
o uso das TIC, mas também através da identificação de 17,7% (GAVE 2010), 13,3%
(GAVE 2011), 18,6% (GAVE 2012) de resultados negativos respeitantes à
compreensão da leitura e 47% de resultados negativos a Português, segundo o
relatório do GAVE (2013), também devido à existência de menos leitores em idade
escolar e à falta de motivação para a leitura realizamos entrevistas a
professores de alunos do 4.º ano do 1.º Ciclo do Ensino Básico, com o objetivos
conhecer (i) as suas opiniões sobre a existência de dificuldades de aprendizagem
na área de Português – Interpretação Textual nos alunos do 4.º ano de
escolaridade, (ii) averiguar qual o uso do computador e/ou recursos multimédia,
nas suas práticas pedagógicas de sala de aula, (iii) compreender em que
atividades utilizam o computador e/ou recursos multimédia e (iv) perceber as
suas sugestões relativamente a práticas para motivar os alunos para a leitura.
No presente artigo são apresentados os
resultados e conclusões retiradas das entrevistas aos professores.
As TIC no processo educativo
Hoje em dia, ouvimos constantemente
diversas entidades a debater sobre a inclusão das tecnologias na educação.
Assim, chegamos ao consenso de que esta inclusão não precisa de ser mais
discutida, mas sim norteada através de uma conceção pedagógica, que possa gerar
mudança de comportamentos na aprendizagem (Ramos, 2008)
Papert (1997) é defensor da
substituição da escola por um novo sistema em que o computador tem um papel
central. Por outro lado, Jesus (2003) luta pela transformação da escola, com
ênfase no papel do corpo docente e na alteração das suas práticas correntes.
Desta forma, o Ministério da Educação e
Ciência (MEC) vem demonstrando a sua preocupação com a atualização das escolas
públicas, tendo implantado nos últimos anos em todo território nacional, aquilo
a que poderemos chamar um programa nacional de Informática na Educação.
De tal forma o MEC teve esse impacto,
que apetrechou as escolas do 1.º CEB com material informático, nomeadamente,
computadores, quadros interativos e outros, para além de efetuar uma ligação à
Internet, o que veio permitir aos alunos do 1.º CEB um maior e para alguns, um
primeiro contacto com esta forma de comunicar e pesquisar. O programa
e-escolinhas, lançado durante a incrementação do Plano Tecnológico na Educação
(PTE) (2007), abriu-nos a possibilidade de, por um lado, cada aluno ter um
computador na sala de aula, e, por outro, poder encetar um processo de mudança
no modo como se aprende, nas formas de interação entre quem aprende e quem
ensina, bem como no modo como se reflete sobre a natureza do conhecimento
(Ramos, 2008).
Atualmente, o MEC suspendeu o PTE e o
programa e-escolinhas, o que faz permanecer a necessidade de dar formação aos
professores no intuito dos mesmos poderem utilizar com sucesso os meios postos
ao seu dispor nas escolas, mas também o de continuar a implementar projetos com
as TIC, usando os dispositivos já fornecidos.
Através da experiência profissional,
verificamos e sabemos como é difícil encontrar uma criança que não fique
deslumbrada quando contacta com um computador.
De facto, o apelo visual é muito forte,
sendo o primeiro critério que a criança usa para aprovar alguma coisa. O facto
de poder lidar com uma máquina imaginada para os adultos, também a atrai muito,
para além das cores, movimento, música, animação e imagens fantásticas. Sabemos
que, quando uma atividade é divertida e envolvente, a criança demonstra prazer
em praticá-la e fica ansiosa por repeti-la.
Sabemos que, quando uma atividade é
divertida e envolvente, a criança demonstra prazer em praticá-la e fica ansiosa
por repeti-la. Assim, neste sentido, podemos referir que os recursos
multimédia, ao integrar diferentes media
na representação da informação, capta a atenção dos sentidos do utilizador,
sobretudo da visão e da audição, e, ao exigir interação física e intelectual do
sujeito, torna-se apelativo para o público-alvo (Carvalho, 2006).
Para Carvalho (2006), este deverá ser o
cenário ideal para se usar o computador como ferramenta de ensino/aprendizagem.
Enquanto docentes, não podemos descurar
na fase de preparação da atividade com computadores, os interesses e
expectativas dos alunos, quando interagem com ambientes inovadores.
Para a criança, a utilização da
informática para a sua aprendizagem pode ser um processo estimulador e permitir
a sua identificação e consequente adesão à difícil arte que, enquanto
professores devemos possuir, a de incutir conhecimento.
A integração de Recursos Multimédia na
sala de aula do 1.º CEB
Um Recurso Multimédia que seja
concebido propositadamente para ser utilizado em situações educativas,
poder-se-á tornar num meio simples e prático para motivar e despertar
interesses, desenvolvendo a criatividade da criança, a concentração e a
memória, com a dupla missão de ajudar a aprender e de ajudar a brincar.
O Recurso Multimédia ensina a navegar,
a aprender o que é preciso explorar, manusear, centrar-se no conteúdo e não na
máquina. Depois de o conhecer e explorar, mais fácil se tornará ultrapassar
métodos de ensino clássicos, para entrar em autênticas viagens de estudos
virtuais, em que o ensino e a aprendizagem se tornarão em momentos de lazer,
mas, ao mesmo tempo, uma resposta educativa contextualizada, com respeito pelas
especificidades e identidade de cada aluno.
Outro aspeto fundamental num Recurso Multimédia
é a facilidade que os alunos devem ter ao usá-lo, ou seja, os alunos devem
possuir as competências informáticas necessárias para o utilizar. Não obstante,
também o Recurso Multimédia deve apresentar características de usabilidade: de
facilidade de aprendizagem, de eficiência na realização de tarefas e de
satisfação (Nielsen, 1993). Deste modo, Ramos (2008), considera que o Recurso
Multimédia permite aos alunos uma aprendizagem mais motivadora, desenvolvendo a
sua criatividade, concentração e memória, através dos sons, das animações, das
imagens, colocando à sua disposição uma grande quantidade de exercícios que
estes podem resolver de acordo com o grau de conhecimento e interesse que têm.
Segundo Klein (2006) são várias as
vantagens que os recursos multimédia apresentam, tais como:
a) Aumenta a atenção e o envolvimento dos alunos;
b) Melhora os resultados de aprendizagem por
conteúdos específicos;
c) Ensina novas competências aos alunos;
d) Aumenta a motivação dos alunos para aprender
de modo a poderem alcançar níveis mais elevados de realização;
e) Introduz os alunos no mundo das tecnologias;
f) Torna as aulas mais dinâmicas;
g) Possibilita encontrar novas e originais formas
de motivar e de despertar o interesse dos alunos;
h) Alarga o potencial de expansão da carreira
docente;
i) Torna a educação mais eficiente;
j) Permite aos alunos tornarem-se mais autónomos
na utilização das TIC e utilizar o software como forma de facilitar o seu
trabalho.
Um Recurso Multimédia proporciona novas
possibilidades de ensinar e aprender a partir das suas interfaces, linguagens,
despertando o interesse de todos os envolvidos no processo.
Papert (1997) defende a ideia de que o
aluno aprende melhor quando é livre para descobrir ele próprio as relações
existentes num dado contexto. Também através do recurso multimédia, dos jogos
que podem conter, é possível proporcionar às crianças uma forma divertida de
aprender, podendo ser usados para ensinar conceitos que na prática são difíceis
de aprender por não existirem aplicações práticas percetíveis de forma mais
imediata para elas (Fino, 2003).
O Recurso Multimédia constitui um
poderoso meio didático que pode ajudar em grande parte professores e alunos no
processo de ensino/aprendizagem. As características comuns destes programas
educativos estão relacionadas com a interatividade e outras características
típicas dos computadores (Fino, 2003).
Por possibilitar rever os caminhos de
aprendizagem percorridos pelo aluno, as novas tecnologias facilitam a deteção
pelos professores dos pontos fortes, assim como das dificuldades específicas
que o aluno encontrou, ou aprendizagem incorreta ou pouco assimilada.
O computador Magalhães na sala de aula do
1.º CEB
A 5 de Junho de 2007 foi lançado o
Programa e-Escola, sendo composto pelas iniciativas: e-Professor, e-Oportunidades,
e-Escolinha e e-Juventude. A iniciativa e-Escolinha emerge de um conjunto de
parcerias entre o Governo Português, a
Intel Corporation, as principais operadoras de telecomunicações, a Microsoft Corporation, a Caixa Mágica e
algumas autarquias. O principal objetivo era o de garantir acesso dos alunos do
1.º CEB, a computadores portáteis pessoais adequados a este nível de ensino, de
forma gratuita ou a preços reduzidos, pretendendo generalizar o uso das TIC nas
primeiras fases da aprendizagem e contribuir para a igualdade de acesso ao
computador e à Internet. O computador portátil tem o nome de Magalhães, sendo
mais resistente ao choque, a líquidos e equipado com software e conteúdos educativos digitais selecionados e adequados,
pelo MEC, a alunos deste nível de ensino, tornando-se no primeiro computador
com acesso à Internet construído em Portugal.
Deste modo, verificamos que segundo o
MEC, através do site do PTE (2009),
foram entregues mais de 600 mil Computadores Magalhães a alunos do 1.º CEB.
Segundo o relatório, Inquérito aos
professores do 1.º CEB destinado à recolha de informação sobre o Programa
e-Escolinha (2010), realizado a um total de 9473 professores do 1.º CEB,
verifica-se que 92% diz que utiliza o computador Magalhães em contexto de sala
de aula. Dos professores que mencionaram que utilizavam o computador, 93% usam
o computador Magalhães para ensinar os alunos a utilizá-lo, 79% menciona que
utiliza o recursos computador Magalhães para os alunos acederem à internet e
71% refere que o utiliza em atividades de leitura. Outro dado interessante
presente no relatório (2010) é o facto de apenas 3% dos professores mencionar
uma utilização do computador diariamente ou quatro dias por semana,
verificando-se 57% dos professores inquiridos que referem a utilização do
computador uma vez por semana.
Verificamos pelos dados, que a chegada
do computador Magalhães às escolas não deve ser associada à ideia de
substituição dos recursos existentes, do quadro, do giz, dos manuais, e, em
última instância, do professor. Porém, deve ser encarado como um suplemento
e/ou um complemento do currículo escolar (Santos, 2006; Ramos, 2008). O
programa e-Escolinhas abriu-nos a possibilidade de, por um lado, cada aluno ter
um computador, contrariando o argumento de que não há computadores suficientes
para uma utilização eficaz na sala de aula, e, por outro, pôde encetar um
processo de mudança no modo como se aprende, nas formas de interação entre quem
aprende e quem ensina e no modo como se reflete sobre a natureza do
conhecimento (Ramos, 2008).
Muitos docentes colocaram questões
relativas a dificuldades no controlo da turma e das ações dos alunos no
computador. Ora, talvez, inicialmente os alunos quererão experimentar os jogos
e outras possibilidades do computador, e, por isso, o professor deve dar esse
tempo aos alunos. Com o passar do tempo, esse aspeto poderia ser facilmente
ultrapassado se o docente encetasse mecanismos de trabalho semelhantes aos que
executa com o caderno diário ou com o manual escolar, sendo o computador
Magalhães a ferramenta de trabalho que permite aprender e divertir, construir e
consultar, como mencionam Santos (2006).
O computador Magalhães pode
proporcionar um ensino individualizado, facilitador da aprendizagem dos alunos.
A escola deverá criar condições para acolher todas as crianças com o duplo
objetivo de educar socializando e habilitar ensinando (Santos, 2006). O
computador Magalhães dá a possibidade de cada aluno aprender ao seu ritmo, a
resposta para um sala de aula inclusiva pode estar mesmo no computador, que
pela sua interatividade, animação e possibilidade de lidar com questões de
controlo e de domínio, intervém realmente tanto no desenvolvimento cognitivo
como no emocional e na aprendizagem da autonomia do aluno (Papert; Ponte,
1997).
Seria erróneo e pouco sensato pensar-se
que o simples facto do professor se disponibilizar para utilizar o computador
na sala de aula vai, por si, resolver os problemas de motivação e interesse e,
conforme revela Papert (1997), torna-se fundamental uma metodologia
construtivista, atribuindo a importância da vertente afetiva da aprendizagem,
porque se aprende, efetivamente, melhor, quando se está verdadeiramente
interessado no assunto.
A utilização do computador Magalhães
pode, assim, inaugurar uma nova visão de organização dentro da sala de aula e,
sobre isto, Ponte (2002) refere que o que está em causa não é uma simples
atualização pedagógica da escola, mas a sua organização em função de novas
necessidades e de novos objetivos sociais, daí que introduzir os computadores
no ensino não deva ser perspetivado à margem do processo educativo em geral.
Proporcionar aos alunos um ambiente motivador, de descoberta, de construção
ativa do desenvolvimento intelectual, torna-se possível colocando as crianças
perante o desafio que lhes podem proporcionar certos recursos multimédia nos
seus computadores Magalhães.
Acreditamos que a utilização do
computador Magalhães, muitas vezes visto nas escolas como o indesejado, possa
ajudar os professores a perspetivar formas diferentes de ensinar e de construir
um currículo inovador e mais adaptado às necessidades específicas dos alunos e
às exigências de uma sociedade em contínua evolução. É indispensável que os
professores, para além de tomarem decisões quanto a metodologias, estratégias e
recursos a utilizar de acordo com os objetivos curriculares que se propõem
atingir, reflitam, igualmente, sobre as potencialidades pedagógicas do
computador Magalhães para determinada atividade, ou seja, vantagens, limitações
e riscos inerentes à sua utilização em contexto educativo.
Metodologia
O inquérito por entrevista foi implementado de forma a recolher
dados descritivos da linguagem dos sujeitos entrevistados para que possamos
desenvolver ideias sobre a forma como esses mesmos sujeitos interpretam os
aspetos questionados (Biklen & Bogdan, 2010). As entrevistas foram
planificadas para serem semiestruturadas, abertas e informais, com o
investigador a dialogar sobre diversos assuntos para ambientar os entrevistados
e sobre os quatro tópicos circunscrevidos, para que se mantivesse um ambiente
favorável, em que os intervenientes se sentissem relaxados e cooperantes, como
referem Biklen e Bogdan (2010). As entrevistas foram gravadas em quatro dias
consecutivos nas respetivas escolas de cada um destes professores. Depois foram
transcritas e sujeitas a uma análise de conteúdo. Bardin (2011, p. 42) define
análise de conteúdo como “um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter,
por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das
mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas)
destas mensagens”. A finalidade da análise é produzir inferência, trabalhando
com vestígios e evidências. Bardin (2011) caracteriza a análise de conteúdo
como sendo empírica e, por esse motivo, não pode ser desenvolvida com base num
modelo exato. Contudo, para sua operacionalização, devem ser seguidas algumas
regras de base, por meio das quais se parte de uma literatura de primeiro plano
para atingir um nível mais aprofundado. Assim, o processo de análise de
conteúdo consistiu, inicialmente, numa leitura flutuante do texto transcrito e
na codificação do material existente: transformação dos dados brutos, por
recorte, classificação, agregação e categorização (Bardin, 2011). Por razões
relacionadas com a limitação de palavras, neste artigo apresentamos apenas um
resumo dos depoimentos dos professores e alguns excertos, considerados mais
relevantes, das vozes dos professores, para ilustrar as inferências feitas. O
instrumento de recolha de dados é composto por quatro questões:
(i) Na sua opinião, qual a razão para existirem
dificuldades de aprendizagem na área de Português – Interpretação Textual, nos
alunos do 4.º ano de escolaridade?
(ii) Qual o uso que faz do computador e de
produtos multimédia na sala de aula?
(iii) Em que atividades utiliza o computador ou um
produto multimédia?
(iv) Na sua opinião, indique como costuma motivar
os alunos para a leitura?
Amostra e perfil da mesma
Definimos como amostra deste estudo
quatro professores do 1.º CEB (n=4) onde estamos a realizar uma investigação. São
três do sexo feminino e um do sexo masculino, com idades compreendidas entre 33
e os 49 anos. Definimos estes quatro professores em específico para as
entrevistas porque, para além de serem os únicos com vínculo ao Quadro de
Escola do Agrupamento que lecionam Português – Interpretação Textual às turmas
do 4.º ano de escolaridade, terem nas suas turmas um computador Magalhães por
aluno que traz instalado diversos recursos multimédia de Português e serem
professores com o Certificado de
Competências TIC adquirido por Formação
Contínua em TIC, capacitando-os como elementos potenciadores da utilização
de recursos multimédia em contexto de sala de aula.
Resultados
Primeira Questão: (i) Na sua opinião, qual a razão para existirem
dificuldades de aprendizagem na área de Português – Interpretação Textual, nos
alunos do 4.º ano de escolaridade?
Professor
A: Considera o facto de os alunos pertencerem a um meio social e económico
baixo, com poucos recursos financeiros e culturais. Acrescenta ainda que há
pouca estimulação para a leitura por parte dos pais. Os alunos estão pouco
motivados para ler e interpretar textos, notando-se falta de vontade em ler.
Professor
B: Refere que os alunos não têm vontade para ler os textos apresentados pelos
manuais escolares, acrescentando que a maioria dos alunos não gosta das
atividades de leitura realizadas. Diz-nos também que o meio onde os alunos
vivem é um fator determinante para as dificuldades de aprendizagem, porque veem
outras atividades como mais importantes e motivadoras.
Professor
C: Neste caso, verifica que as dificuldades de aprendizagem são devido aos
encarregados de educação não cumprirem algumas recomendações da escola, pela
falta de importância que dão a algumas das atividades e trabalhos propostos,
decorrendo falta de motivação para a leitura. O facto de não terem hábitos de
leitura também é um elemento determinante para as dificuldades de aprendizagem
na área de Português. Entende ainda que não gostam de ler livros e que preferem
jogar jogos de computador.
Professor
D: Menciona a falta de hábitos de leitura em casa e falta de uma cultura de leitura
como determinantes. Porém, não estarem motivados para ler os textos
apresentados faz com que também não os interpretem. O meio social e económico
onde vivem os alunos também determina que possam ter mais dificuldades por
serem menos estimulados.
Verificamos que os docentes respondem à
questão em causa colocando o enfoque principal no meio social e cultural de
proveniência dos alunos, “têm grandes dificuldades económicas” (Professor A). Apontam
também a pouca estimulação e apoio familiar dado pelos encarregados de educação
para a leitura e para bons hábitos de leitura, muito por não seguirem algumas
sugestões e atividades realizadas através e na escola, “Não frequentam a
biblioteca, nem leem nada que mandamos para casa, os pais não leem jornais”
(Professor-C). No entanto, assinalam ainda, a falta de motivação dos alunos
para o ato de ler como o mais determinante, mostrando neste item, clara
unanimidade, “Vê-se que não gostam de ler” (Professor D); “Preferem joguinhos
de computador em vez de um bom livro” (Professor C). Realce também para a forma
de apresentação dos textos que justificam ser desmotivadora, por serem manuais
escolares “Ainda se os textos fossem de obras originais, os manuais não são
completos” (Professor B). Estes resultados são comprovados pelos estudos de Rebelo
(1993), Fonseca (1999), Castro e Gomes (2000) e Santos (2004).
Segunda Questão: (ii) Qual o uso que faz do computador e de produtos
multimédia na sala de aula?
Professor
A: Utiliza poucas vezes e apenas para a projeção de fichas formativas no Quadro
Interativo Multimédia (QIM). Refere a existência de uma licença para um Recurso
Multimédia, mas nunca o usou. De vez em quando, nomeadamente, nos finais de
período coloca a projeção de filmes infantis no QIM.
Professor
B: Não dá qualquer uso ao computador nem a qualquer produto multimédia.
Professor
C: Não utiliza o computador nem recursos multimédia.
Professor
D: Utiliza o computador com pouca regularidade e quando utiliza é para a
projeção de fichas formativas no QIM, bem como projeção de filmes infantis e
músicas na área de expressão musical.
Deste modo, constatamos que dois dos
professores não dão qualquer utilização às TIC, enquanto os outros dois docentes
dão pouca utilização às TIC, conforme já nos relatam os estudos de Silva (2005)
e Santos (2006). De referir que as salas de aula do Agrupamento de Escolas
contam todas com QIM, computadores e impressoras e todos os alunos têm
computadores Magalhães, perfazendo um computador por aluno (1:1). Porém, dois professores
referem que do pouco uso que fazem das TIC, usam o computador para projeção de
fichas formativas, no QIM, ou de músicas para a área de expressão musical, “De
vez em quando projeto uma ficha para eles copiarem” (Professor D). Em situações
muito remotas, também dão uso ao computador e QIM para a projeção de filmes
infantis, “Gosto de lhes mostrar filmes no computador, de resto distraem-se
muito” (Professor A). Todos os docentes referem que não usam quaisquer recursos
multimédia, “Não uso computadores nem recursos porque são uma perda de tempo
que pode ser útil para trabalharem de outra forma” (Professor B); “Temos
licenças da Escola Virtual, mas como não percebo nada de computadores não lhes
dou uso” (Professor C). Porém o Agrupamento de Escolas adquiriu licenças para
todas as turmas do Recurso Multimédia “Escola Virtual”, bem como entregou
diferentes DVD-ROM às escolas, sendo estes completamente excluídos do ato
pedagógico, também perspetivados nos estudos de Coutinho (2008; 2009).
Terceira
Questão: (iii) Em que atividades de Português
utiliza o computador ou um produto multimédia?
Professor
A; Professor D: Mencionam que utilizam o computador e o QIM em atividades de Português,
como são o caso da projeção das questões de interpretação de um texto no QIM,
embora esporadicamente.
Professor
B; Professor C; Referem que não dão qualquer utilização ao computador e que não
veem qualquer vantagem na utilização de tecnologia em contexto educativo por
ser um elemento de distração dos alunos, e porque já o utilizam bastante em casa.
Os docentes veem na projeção de fichas
formativas uma atividade de Português, “Projeto fichas formativas para eles
copiarem e resolverem” (Professor A); “Tento mostrar fichas que depois são mais
fáceis de corrigir no QIM” (Professor D). Mas dois deles são muito críticos na
utilização de computadores na sala de aula, justificando a sua não utilização
como sendo elementos de distração dos alunos e como sendo algo com apenas
utilidade lúdica, “Só serve para se distraírem nas aulas” (Professor B); “Os
computadores com todos os joguinhos que trazem fazem com que os alunos não
aprendem o que interessa” (Professor C). Os docentes B e C referiram ainda que
proíbem os alunos de levarem o computador Magalhães para a escola, “Jogar
computador é em casa, porque aqui é para aprender, não é para jogar” (Professor
B); “Não deixo os alunos trazerem os computadores para a escola, porque
estragam-se aqui e os pais depois vêm cá tirar satisfações” (Professor C).
Assim, não há qualquer outra utilização das TIC em atividades de Português.
Estes resultados vão de encontro às conclusões dos estudos de Silva (2005) e
Santos (2006).
Quarta Questão: (iv) Na sua opinião, indique como costuma motivar
os alunos para a leitura?
Professor
A: Refere que a criação de uma biblioteca de turma poderia motivar os alunos,
porque requisitavam os livros e levavam-nos para casa e assim participavam com
os pais no processo de leitura. Menciona ainda a utilização de materiais
pedagógicos apelativos, como cartazes ou recursos multimédia, para que os
textos aparecessem de outra forma para que se motivassem.
Professor
B: Apresenta a solução de criação de cantos de leitura dentro da sala de aula,
em que os alunos pudessem estar à vontade e pegasse nos livros livremente.
Refere também que a ida de escritores à escola poderia incentivar os alunos a
conhecer a biografia e a ler os livros desse autor e talvez pudessem ler textos
no computador quando estão em casa.
Professor
C: Realça a visita dos alunos com os encarregados de educação a bibliotecas, a
compra ou empréstimo de livros pelos pais ou pela escola como determinante para
motivar os alunos para a leitura. Levar pessoas à escola para lerem livros é
outra solução apresentada pelo docente, assim como a utilização do computador
em casa para outras atividades em vez dos jogos.
Professor
D: Verifica a necessidade de utilizar recursos pedagógicos que motivem os
alunos e que sejam diferentes dos que utilizam, como são os casos dos recursos
multimédia. Atenta ainda numa maior implicação dos pais no processo de
motivação da leitura, com recomendações de compra ou empréstimo de livros com a
criação de uma biblioteca de turma. Refere ainda a criação de livros de
histórias criadas pelos alunos e a ida de escritores à escola como outros
exemplos de estratégias de motivação dos alunos para a leitura.
Os docentes sugeriram algumas
estratégias de motivação para a leitura como, a entrega de livros aos alunos,
numa perspetiva de biblioteca de turma, com a requisição de livros para levarem
para casa e lerem em conjunto com os pais, “Era interessante enviar livros para
casa, de modo a serem lidos por pais e filhos, numa perspetiva de biblioteca de
turma” (Professor A). Outro fator apontado para motivar os alunos para a
leitura foi o uso de materiais pedagógicos apelativos, como recursos multimédia
ou cartazes, “Penso que há jogos de computador muito apelativos e que os alunos
ficam motivados”; “Tenho pena de não ter tempo para explorar a Escola Virtual e
outros CD’s com atividades de leitura” (Professor A). Referiram ainda, que
deviam alterar a pedagogia de modo a tentar com que a leitura fosse um prazer,
criando espaços denominados de “cantos de leitura” dentro da sala de aula, ou
convidando escritores a ir à escola ler histórias, “A sala devia ter um canto
só para ler”; “Os alunos ficariam motivados se vissem e conversassem com
escritores”; “Como gostam dos computadores, podiam ler textos no computador em
casa” (Professor B); “Deviam visitar a biblioteca”; “Em vez dos joguinhos
podiam usar o computador para ler ou pesquisar informação correta na internet”
(Professor C); “Penso que os alunos estariam mais motivados se usassem mais
recursos multimédia”; “É preciso uma formação em TIC para professores, que seja
efetiva” (Professor D). Assim também referem Monteiro e Mata (2001), Sim-Sim
(2001) e Santos (2004) nos seus estudos sobre esta problemática.
Além das questões do guião, percebemos
que os professores conhecem diversos recursos multimédia e, embora com um
certificado de competências TIC emitido pelo MEC, revelam falta de competências
para lidar com os diferentes dispositivos, nomeadamente o computador e o QIM,
“É preciso mais formação em TIC” (Professor A, D). Porém, segundo os docentes,
a maior dificuldade é em preparar pedagogicamente as atividades com a
utilização de todos estes recursos motivadores para os alunos, enveredando pela
tradição por serem estratégias com as quais estão habituados, “Falta tempo para
planificar”; “Perdemos muito tempo com essas atividades” (Professor A); “Tenho
receio de alguma coisa avariar e não saber como resolver”; “Conheço mal alguns
dos recursos” (Professor D). Os docentes mais avessos à utilização do
computador, responderam que a falta de preparação e domínio de softwares e
hardwares leva-os a defenderem a utilização dos mesmos como sendo algo de
negativo e porque não compreendem como é que os jogos interativos multimédia
podem ajudar em termos pedagógicos, já que os veem como atividades menores no
desenvolvimento educativo, bem como uma perda de tempo letivo na sua
agilização, “Os jogos são só brincadeira e depois quando é que eles aprendem”;
“Também não percebo muito de computadores e dessas tecnologias novas”
(Professor B); “Tenho pena que hoje em dia só se pense em jogos de computador,
porque os alunos vão perdendo a concentração nas atividades da escola”
(Professor C).
Conclusões
Se atentarmos nas respostas dados pelos
professores, verificamos que entendem a necessidade de alterar pedagogias para
motivar os alunos, reconhecendo que as TIC e a sua utilização fora da escola é
mais motivadora que as atividades que realizam na sala de aula. Assim, não
deverão estes docentes tentar trazer essa tecnologia/inovação para as suas
práticas pedagógicas e assim com ela trazer motivação?
Nestas entrevistas realçamos o facto de
os docentes terem ao seu dispor salas equipadas com QIM, computadores,
impressoras e um computador Magalhães por aluno que traz instalado diversos
recursos multimédia de Português, mas os docentes além de os desconhecerem,
evitam trabalhá-los e até proíbem a sua utilização. Verificamos pelos
depoimentos dos professores, que estes sentem dificuldades em trabalhar com as
TIC e com recursos multimédia em contexto de sala de aula, tanto por falta de
competências, bem como pelo receio de errar em frente aos alunos, devido à
insegurança nos seus conhecimentos em TIC. Ora, estes dados dão-nos a
perspetiva, que a Formação Contínua em
TIC estará de algum modo a falhar nos seus intuitos, visto que estes
professores beneficiaram de formação e obtiveram um Certificado de Competências TIC, que na realidade do seu dia-a-dia
não reflete esse mesmo conhecimento.
Uma outra conclusão é o facto de todos
os docentes identificarem nas suas turmas dificuldades de aprendizagem e de
motivação para a leitura, relacionado com o aspeto de não utilização das TIC em
contexto de sala de aula. Porém, não deixa de ser interessante que todos
recomendam a utilização ou do computador ou de recursos multimédia como uma das
soluções para motivar os alunos para a leitura.
Em suma, quando analisamos a sociedade
em que vivemos, vemos que esta se insere num novo paradigma, sendo cada vez
mais tecnológica. Assim, e uma vez mais, terá de ser a escola a adaptar-se às
novas realidades e aos novos contextos educativos. A questão da utilização das
TIC nos processos de aprendizagem é premente, devendo ser fundamental a sua
implementação como forma de tornar a escola, novamente, motivadora. E se o uso
dos computadores por parte das crianças é cada vez mais uma constante, então a
escola tem que se adaptar, alterar hábitos, métodos e pedagogias, porque a
inovação já é a nova tradição.
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