Introdução
A transformação da escola passará, num futuro próximo, pelo mobile learning [Powell et al., 2011;
Moura, 2010]. Cada vez mais a aquisição de conhecimento passa pela mobilidade
dos alunos, dos contextos em que se inserem e dos conteúdos, sendo que o mobile learning é uma forma de promover
estas três condições. O mobile learning
potencia novas formas de aprender, colaborar, projetar e construir
conhecimento, na criação de novos ambientes e espaços de aprendizagem [Shum
& Crick, 2012]. O ato de ler e compreender a leitura é um processo
interativo e participativo que beneficia com estas novas formas de aprender.
Isso não acontece atualmente e a prova são os resultados finais das Provas de
Final de Ciclo do 4.º ano de escolaridade, [IAVE, 2010; 2011; 2012; 2013] no
1.º Ciclo do Ensino Básico (1.º CEB) continuam a revelar dificuldades.
Propomo-nos a realizar um estudo que vise o desenho,
desenvolvimento, implementação e avaliação de um software para dispositivos móveis com alunos 3.º ano de
escolaridade do 1.º CEB que promova a aquisição de competências de
interpretação textual de textos narrativos e simultaneamente o gosto pela
leitura.
Estado da Arte
A utilização pedagógica das TIC está em transformação, como
comprovam relatórios europeus [Mascheroni & Ólafsson, 2014] e nacionais
[Simões et al., 2014], que destacam a necessidade dos professores melhorarem as
suas práticas pela integração dos dispositivos móveis em contextos de sala de
aula como um pilar na aprendizagem de alfabetização e novas literacias. A
necessidade de atualização neste contexto é muito saliente, sobretudo se
considerarmos que o desenvolvimento profissional dos professores afeta o
desempenho dos estudantes e a sua aprendizagem [Yoon et al., 2007]. A
mais-valia do uso dos dispositivos móveis em contexto escolar tem sido
defendida por diversos autores [Attewell et al., 2014; Kukulska-Hulme, 2012],
argumentando que, enquanto sistemas tangíveis, os dispositivos móveis colocam a
ênfase na interação entre a criança e a tarefa, na manipulação com conteúdo,
evitando também assim a carga cognitiva adicional à já existente na interação
com o conteúdo. Quanto maior for o envolvimento do aluno na manipulação criativa,
na pesquisa, na interação com o próprio conhecimento, na descoberta de novas
formas de expressão de saberes, maior será a eficácia didática deste processo
[Moura, 2015].
Num estudo de Moura [2010], os alunos demonstraram
satisfação em usar os seus telemóveis, foram mais participativos, empenhados e
aperfeiçoaram as suas competências de língua, objeto particular da aprendizagem.
Por serem dispositivos convergentes, portáteis e multimédia os dispositivos
móveis representam uma alternativa que pode ser explorada [Shum & Crick,
2012; Powell et al., 2011]. Há uma grande familiaridade dos alunos com estes
dispositivos [Kadyte, 2004] por serem uma tecnologia comum no dia-a-dia, pela
sua mobilidade e portabilidade, pelo desenvolvimento de aspetos cognitivos
usando recursos multimodais, atributos que são cada vez mais considerados [Kukulska-Hulme,
2012].
A compreensão do texto escrito continua a ser uma
competência fundamental dos cidadãos e, por isso mesmo, alvo de interesse
investigativo particular nos estudos que visam a implantação das TIC em
contexto educativo. Os resultados gerais do estudo PIRLS 2011, uma avaliação
internacional de competências de literacia em leitura dos alunos do 4.º ano de
escolaridade, na qual Portugal participou pela primeira vez em 2011 e que
revelou que os alunos portugueses avaliados se situaram "entre os 19
países com melhor desempenho em leitura para o 4.º Ano" [ProjAvi, 2012, p.
2], num total de 45 países participantes. No entanto, os resultados parcelares
revelaram que "os alunos Portugueses do 4.º ano tiveram desempenho (...)
abaixo dessa média quando a finalidade de leitura era literária" [idem, p.
7]. Por outro lado, os resultados das Provas de Aferição internamente levadas a
cabo no 4.º ano do 1.º CEB, denominadas desde 2013 de Provas Finais de Ciclo,
revelam percentagens surpreendentemente altas de valores negativos respeitantes
à compreensão da leitura [13,3% [IAVE 2011], 18,6% [IAVE 2012]], num contexto
global de 47% de resultados negativos a Português, segundo o relatório do IAVE
[2013]. Torna-se, por isso mesmo, relevante o estudo do impacto da introdução
de ferramentas TIC e, em particular de dispositivos móveis, na redução desta
dificuldade.
Questão de investigação
Assim, definimos a seguinte questão de investigação: De que
forma um software desenhado,
desenvolvido, avaliado e implementado com alunos do 1.º CEB para dispositivos
móveis leva à aquisição de competências de interpretação de textos narrativos?
Objetivos
a)
Desenhar e desenvolver um software de interpretação textual criado para dispositivos móveis.
b)
Promover formação de professores do 1.º CEB sobre
inovação pedagógica usando o software
desenvolvido e dispositivos móveis.
c)
Monitorizar a utilização do software e os dispositivos móveis em contexto de sala de aula pelos
professores.
d)
Implementar o software
em contexto de sala de aula com alunos 3º ano do 1.º CEB utilizando
dispositivos móveis.
e)
Avaliar os resultados da utilização do software e dos dispositivos móveis na
aquisição de competências de interpretação textual.
f)
Avaliar os resultados da utilização do software e dos dispositivos móveis no
gosto pela leitura e interpretação de textos.
Metodologia
A metodologia proposta é a development research [van den Akker, 1999], sendo uma vertente
descendente da modalidade de investigação-ação. É uma abordagem metodológica
muito usada no desenho e desenvolvimento de software
porque, “por um lado, valoriza o esforço do designer no desenvolvimento do
objeto e, por outro lado, considera a complexidade do contexto de aprendizagem”
[Lencastre, 2012: p.53].
Iremos seguir a interpretação que nos é sugerida por van den
Akker [1999], com quatro etapas sequentes: [i]
Preliminary investigation, [ii] Theoretical embedding, [iii] Empirical testing,
e [iv] Documentation, analysis and reflection
on process and outcomes.
Na [i] Preliminary
investigatio: iremos para o terreno saber das razões das dificuldades dos
alunos do 3.º ano do 1º CEB na interpretação de textos de Português, e sobre a
integração de mobile learning na sala
de aula e na formação de professores. Seguidamente, [ii] Theoretical embedding atualizaremos o “estado da arte” e desenharemos
o protótipo e a nossa intervenção tendo em conta as linhas orientadoras do
programa curricular de Português. No final do 1.º ano teremos o estado da arte
atualizado, uma versão Alpha do
protótipo e um modelo de formação de professores de utilização da ferramenta
desenvolvida em Tablets na sala de
aula. A etapa [iii] Empirical Testing define-se
como o processo cíclico de avaliação da usabilidade onde vamos confirmar as
decisões tomadas na etapa anterior. Realizaremos a formação de utilização de Tablets em contexto de sala de aula aos
professores das escolas protocolados. Finalmente, a [iv] Documentation, Analysis and Reflection on process and outcomes é
uma etapa reflexiva que culmina com a apresentação e análise de todos os dados
recolhidos nas diferentes etapas anteriores e é também nesta etapa que
retiramos as nossas conclusões finais e apresentamos sugestões para estudos
futuros.
Resultados esperados
Pretendemos que através do software desenvolvido para a utilização dos dispositivos móveis haja
uma melhoria eficiente de aquisição de competências de compreensão textual e
gosto pela leitura dos alunos do 1.º CEB. É um facto que a tecnologia por si só
não irá alterar qualquer resultado de aprendizagem, mas é através de um uso
pedagógico da mesma que acreditamos numa mudança de comportamentos pedagógicos.
Esta é outra ambição deste estudo, facilitar conhecimentos técnicos e
pedagógicos aos professores, de modo a que estes inovem pedagogicamente tendo
por base a utilização dos dispositivos móveis.
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